sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Teoria potencial no plano e no espaço

Abaixo $x,x_i,y$ são todos vetores em $\mathbb{R}^3$.

O potencial gravitacional $\phi$ de uma partícula de massa $M$ num ponto situado a uma distância $x$ da partícula é
$\phi(x) = -G M/{\vert x\vert}$, onde $G$ é a constante gravitacional universal e $M$ é a massa da nossa partícula.

Daqui para frente nós vamos assumir que $G = 1$.

Dado um sistema de partículas posicionadas nos pontos $(x_i)_{i=0}^N$ o potencial gravitacional gerado por esse sistema de $N$ partículas é dado por
$\phi(x) = -\sum_{i=1}^N \frac{m_i}{\vert x - x_i\vert}.$

O mesmo vale para uma distribuição contínua de matéria,



e nesse caso o potential gravitacional vira $\phi(x) = \int_B \frac{dm(y)}{\vert y - x\vert} = \int_B dy \frac{\rho(y)}{\vert y - x\vert},$ onde $\rho(y)$ é função de densidade da distribuição de massa no corpo $B$. 
Nessa última equação nós estamos supondo que $x,y$ são vetores bi-,tri-dimensionais etc. e que $dy$ é uma forma de volume, ou elemento de volume. 


Vale a pena ressaltar aqui que o potential gravitacional em qualquer dos casos acima satisfaz a chamada equação de Poisson, 
$$\triangle \phi = \rho(x),$$
onde $\triangle = \frac{\partial^2}{\partial x^2} + \frac{\partial^2}{\partial y^2} + \frac{\partial^2}{\partial z^2}$ é o operador de Laplace.  Por quê? Consulte o seu livro favorito de mecânica clássica. 


Portanto dada uma distribuição de massa $\rho(x)$ nós podemos tentar resolver para $\phi(x)$ para determinar o potencial gravitacional definido pelo corpo $B$. Pela mesma razão, o operador $\triangle$ aparece em eletromagnetismo clássico na determinação do potential elétrico definido por uma distribuição de cargas $\rho(x)$. 
No caso de uma massa puntual, a densidade é uma função delta e $\rho(x) = \delta(x - x_0)$ onde $x_0$ é a localização da massa, ou carga no espaço. 
A solução da equação de Laplace é para uma massa ou carga puntual é chamada de função de Green ou função de influência da carga em $x_0$. 
No caso do operador de Laplace essa função de Green é exatamente o potencial gravitacional de uma partícula massiva ou carga puntual e é dada (módulo constantes de proporcionalidade) por $\phi(x) = \frac{1}{\vert x - x_0\vert}$. 


Note que para uma distribuição de carga, ou de massa, contínua o potencial gravitacional é a convolução da função de Green com a distribuição de massa $\rho(x)$. 


Vamos considerar agora as soluções da equação de Laplace no plano. 
Isto é, em seguida nós vamos estudar a equação 
$$u_{xx} + u_{yy} = 0,$$ ou ainda
$$(\frac{\partial^2}{\partial x^2} + \frac{\partial^2}{\partial y^2})u = 0.$$


Nós veremos em breve que existe uma relação profunda entre teoria potencial (soluções da equação de Laplace) e teoria de funções no plano complexo $\mathbb{C}$. 


Para começar vamos recordar alguma notação do curso de cálculo complexo. Seja $z = x + \sqrt{-1}y$ onde $\sqrt{-1} = i$ é a constante imaginária. 


No plano complexo $\mathbb{C}$ nós podemos definir dois operadores lineares, 
$$\frac{\partial}{\partial z} = \frac{1}{2}(\frac{\partial}{\partial x} - i \frac{\partial}{\partial y} ),$$ e 
$$\frac{\partial}{\partial \bar{z}} = \frac{1}{2}(\frac{\partial}{\partial x} + i \frac{\partial}{\partial y} ).$$


Nós dizemos que $f(z,\bar{z}) = u(x,y) + \sqrt{-1} v(x,y)$, diferenciável, é analítica (complexa) num aberto $U$ se 
$\frac{\partial}{\partial \bar{z}} f(z,\bar{z})=0$ em $U$. Isso significa que $f = f(z)$ somente e que $f(z)$ (corolário) pode ser expandida como uma série de Taylor infinita em $z$ no aberto $U$. O aberto $U$ pode ser uma vizinhança (bola) de algum ponto $z_0$ fixo. 
Funções analíticas complexas são também chamadas de holomorfas.


As partes real e imaginária da equação $\frac{\partial}{\partial \bar{z}} f(z,\bar{z})=0$ são exatamente as equações de Cauchy-Riemann do cálculo complexo: 
$\frac{1}{2}(\frac{\partial}{\partial x} + i \frac{\partial}{\partial y} ) (u(x,y) + i v(x,y)) = 0 $
$\Rightarrow u_x - v_y = 0, v_x + u_y = 0.$ 


Você pode verificar que $\triangle = 4\frac{\partial}{\partial z} \frac{\partial}{\partial \bar{z}}$ e portanto as partes reais de imaginárias de qualquer função holomorfa é harmônica! 
O conhecimento desse fato simples nos presenteia com um estoque gigantesco de funções harmônicas. Portanto dado $f(z)$ harmônica, $\log f(z)$ é harmônica também. Use a sua imaginação para criar outros exemplos. 


Nós demonstramos que a parte real (ou imaginária) de toda função holomórfica é harmônica. Será que a recíproca é verdadeira? Em geral sim. 


Teorema 1. Num domínio simplesmente conexo, toda função harmônica é a parte real de uma função analítica complexa, módulo uma constante puramente imaginária. 


Nós queremos determinar $f = u + iv$, com $u$ dado. 
Mas $u_x - v_y = 0$ e $u_y + v_x=0$,
e portanto 
$v(x,y)$ = integral de linha de $\nabla v$ de $(x_0,y_0)$ fixo até $(x,y)$.
Mas $\nabla v = (-u_y,u_x)$ e as funções $u_x,u_y$ são dadas. Como o domínio é simplesmente conexo, 
o valor da integral não depende do caminho e a única escolha feita foi o início do caminho de integração.


Portanto $v$ fica unicamente determinada módulo uma constante imaginária, como nós queriamos demonstrar. 


Portanto a teoria das funções analíticas, e funções harmônicas (soluções da equação de Laplace) coincidem no plano. 


Teorema 2. (O teorema do valor médio.) O valor médio de uma função harmônica ao longo de um círculo é igual ao valor dessa função no centro do círculo. 
Suponha que o centro do círculo esteja localizado na origem, e suponha que o raio do círculo é $R$. Isso pode ser feito sem perda de generalidade. 


A demonstração é a seguinte. Como nós sabemos, $u$ = parte real de $f(z)$ para algum $f(z)$ definido numa vizinhança gorda do disco limitado pelo círculo. . 
Portanto, pela fórmula integral de Cauchy do cálculo complexo,
$f(0) = \frac{1}{2\pi i}\int_{\gamma} dz \frac{f(z)}{z} =  \frac{1}{2\pi }\int_0^{2\pi} f(R\exp(i\phi)) d\phi$, e $f = u + i v$. Separando as partes reais e imaginárias nos dois lados da última igualdade nós obtemos o resultado desejado. 


Corolário. Uma função harmônica não pode ter pontos de máximo ou mínimo (no sentido fraco) no interior do seu domínio de definição. 


Vamos assumir que $u(x,y)$ não constante. Esse caso é trivial. 


Ponto de máximo (resp. mínimo) fraco, e local significa que $u(x_0,y_0) \geq u(x,y)$ (resp. $\leq u(x,y)$) para todo $(x,y)$ próximo de $(x_0,y_0)$. 


Considere um cículo pequeno ao redor de $(x_0,y_0)$. Então por continuidade a função é sempre menor em torno de um arco pequeno perto $(x_1,y_1)$ no círculo.








Portanto a média da função no círculo é menor que o valor da função no centro, uma contradição. Portanto a função é constante numa vizinhança de $(x_0,y_0)$. Portanto o conjunto dos pontos $\{(x,y): u(x_0,y_0) = u(x,y)\}$ é aberto e fechado. 
Portanto como $D$ é conexo esse conjunto têm de coincidir com o domínio $D$ da função $u$, contradizendo nossa hipótese inicial. Portanto, se a função não é constante, e é harmônica a função não admite um máximo ou mínimo (fraco) global no interior do domínio. Quando a função têm uma extensão contínua para a fronteira, então como consequência o valores máximo e mínimos são realizados na fronteira. 


Corolário. (Outro corolário do teorema do valor médio.) Seja $D$ um domínio limitado, com fronteira suave por partes. Seja $g$ uma função contínua na fronteira. Se existe $u$, harmônica em $D$ que se extende à $g$ na fronteira, então $u$ é única.


Em outras palavras, a solução do problema de Dirichlet, se ela existe ela á única. 












sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Lista de exercícios no. 3

1. Verifique a validade do princípio do máximo para a função harmônica
$u(x,y) = \frac{1-x^2-y^2}{1 - 2x + x^2 + y^2}$ no disco $\overline{D} = \{x^2 + y^2 \leq 1.\}$ Explique o seu raciocínio.

2. Qual a forma do Laplaciano em coordenadas polares? Verifique que
$$\Delta = \frac{\partial^2}{\partial r^2} + \frac{1}{r}\frac{\partial}{\partial r} + \frac{1}{r^2}\frac{\partial^2}{\partial r^2}.$$
Verifique também que $r^{\vert k\vert} \exp(ik\theta)$ é harmônica para todo $k$ inteiro.

3. Calcule todas as soluções da equação de Laplace que só dependem de $r$.

4. Suponha que $u$ é harmônica no interior do disco de raio $2$, i.e. em $D = \{ r < 2\}$ e que na fronteira assuma a forma $u = 3\sin(2\theta) + 1$. Sem calcular a função $u$ responda às seguintes questões:
(a) Qual o valor máximo de $u$ em $\overline{D}$?
(b) Qual o valor de $u$ na origem?

5.  Resolva a equação de Laplace $\Delta u = 0$ no disco de raio $R$ com condição de fronteira $u = 1 + 3\sin(\theta)$.

6. (O método de Rayleigh-Ritz.)
Suponham que nós queremos resolver a equação de Laplace
num domínio limitado $D$, com condição de fronteira $u\vert_{\partial D} = h$ e sejam $(w_k)_{k=0}^N$ funções arbitrárias tais que $w_0\vert_{\partial D} = h$ e $u_{k\geq 1}\vert_{\partial D} = 0$.

Defina a forma de energia de Dirichlet,
$$E(u,v) = \int\int_{D}(\nabla u\bullet \nabla v) dx\wedge dy.$$

Nosso problema é encontrar constantes $(c_i)_{k=0}^N$ que $u_N = \sum_{k=0}^N c_k w_k$ minimiza $E(u_N,u_N)$.

O princípio de Dirichlet (que nós vamos discutir mais tarde no curso) diz que as soluções da equação de Laplace minimizam o funcional de energia acima.

Mostre que as constantes que resolvem o problema satisfazem $\sum_{k=1}^N E(w_j,w_k)c_k = - E(w_0,w_j), j = 1,2,\dots, N.$

7. Considere a equação de Laplace $\Delta u  = u_{xx} + u_{yy} = 0$ no triângulo $$\{x>0,y>0, 3x + y < 3\}$$ e com condições de fronteira
$$u(x,0) = 0, u(0,y) = y(3-y), u(x,3-3x) = 0.$$
Escolha $w_0 = y(3-3x - y)$ e $w_1 = xy(3-3x-y)$. Encontre $u_1 = c_0 w_0 + c_1 w_1$ que melhor aproxima $u$ na norma da energia (de Dirichlet).
Isto é, encontre a aproximação de Rayleigh-Ritz de $u$ no triângulo acima.

Em seguida inclua um terceiro polinômio $w_2 = x^2 y (3 - 3x - y)$. Calcule uma aproximação da forma $u_2 = c_0 w_0 + c_1 w_1 + c_2 w_2$.
Será que a energia de $u_2$ é menor que a de $u_1$ acima?

8. (a) Se $u = f(x/y)$ é harmonica, resolva a equação diferencial que $f$ satisfaz.
(b) Mostre que $\frac{\partial}{\partial r}u = 0$.
(c) Mostre que $y>0$ e $\frac{\partial}{\partial r}v(r,\theta) = 0$ então $v$ é da forma $f(x/y)$.
(d) Encontre o limite $\lim_{y\to 0} u(x,y) = h(x)$.

9. (a) Use o exercício anterior para encontrar a função harmonica no semi-plano superior $\{y > 0\}$ que satisfaz $h(x) = 0$ se $x<0$ e $h(x) = 1$ se $x>0$.

(b) Seja $-\infty = a_0 < a_1 < a_2 < \dots < a_{N-1} < a_N = \infty$ uma partição da reta real, e seja $h(x) = \sum_{k=0}^N c_k \chi_k$ uma função escada.
A função $\chi_k$ é a função característica de $(a_k,a_{k+1})$.
Resolva a equação de Laplace em $\{y>0\}$ com condição de fronteira $h(x)$.

10. (Funcões de Green para problemas de fronteira.)
Considere $x_0 \in (0,l)$ onde $l$ é um parametro real positivo.
Encontre a unica função no intervalo $(0,l)$ que satisfaz
i. $G''(x) = 0$ se $x\neq 0 $;
ii. $G(0) = G(l) = 0$;
iii. $G(x)$ é continua em $x_0$ e $G(x) + \frac{1}{2}\vert x - x_0\vert$ é harmonica em $x_0$.

Lista 4 será sobre aplicações de teoria potential em eletrostática e gravitação.

domingo, 18 de setembro de 2011

Gráfico de uma função harmônica

Esse é o gráfico da parte imaginária do função logaritmo $\log(z)$. Nessa figura nós estamos considerando o ramo da função logaritmo definida no plano menos o eixo real não positivo. O círculos na figura são as fronteiras de vizinhanças abertas, e o diagrama está ilustrando o processo de continuação analítica.

Outro exemplos interessantes são os gráficos da parte real e imaginárias de $\exp(z)$.

A fileira de baixo corresponde às curvas de nível da função. Tente verificar visualmente porque a propriedade do valor médio das funções harmônicas é verdadeira no caso da função exponencial. 

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Sobre a escala de notas na prova P1

Nota máxima: 40 pontos.

26 pontos ou mais é excelente (> 90%);
16 pontos é bom (> 70%);
12 pontos é média ( > 50%).


Seminário QTP no. 2. Compareçam!

Essa segunda edição Q.T.P. será ministrada pelo Fred, conhecido de
todos pela sua dedicação e carinho à PUC:

Prof. Carlos Frederico Palmeira (departamento de Matemática, PUC-Rio):
http://www.mat.puc-rio.br/~fredpalm/
3a feira, dia 20/09, Sala 856L (sala de seminário do DMAT)

Topologia Simples Aplicada a Dinâmica dos Fluidos
- O estudo de um sistema de 2 equações diferenciais parciais que
aparece em mecânica de fluidos, leva a famílias  de curvas a dois
parâmetros no plano, e isso por sua por sua vez leva a famílias, bem
mais simples, de curvas em uma superfície M de dimensão 3 mergulhada
em R4. Consideramos o caso em que as equações originais são bastante
simples (envolvendo polinômios de grau 2) e obtemos bastante
informação sobre a família de curvas em M, que podem ser transferidas
para  as soluções do sistema original.